“Andei pensando”, diz Thunder com sua voz estentórea. “Sobre o dilema sinistro de Henry, personagem de Philip Roth em O Avesso da Vida: a virilidade ou a morte?”
“É um tema fascinante”, respondo.
Henry tem que fazer sua escolha. Tem um problema no coração que o obriga a tomar um remédio que o fez impotente, logo ele, um escravo dos sentidos. A alternativa é uma cirurgia com boas chances de matá-lo.
Que fazer?
“Penso em mim”, diz Thunder. “Se me coubesse a escolha, optaria pelo risco da cirurgia. A impotência é uma morte em vida. Uma agonia servida em gotas. Não poder entrar numa mulher que se oferece a você. É completamente contra a natureza. Vê-la em sua nudez esplêndida e não ter nada a fazer. Prefiro o pelotão de fuzilamento. Mil vezes ser um mendigo potente do que um milionário impotente.”
“A vida vai além do sexo”, digo. “O sexo é uma ilusão escravizadora. Marco Aurélio, o rei-filósofo, disse em suas Meditações que o sexo é uma mistura de fluidos de duas pessoas em posição ridícula.”
“Devia ser broxa ele”, diz Thunder, sem nenhuma consideração para com o monarca que simbolizou o sonho de Platão de um governante sábio. “Pessoas com nome duplo são muitas vezes esquisitas.”
Eu sabia que não havia base científica nenhuma para as palavras de Thunder sobre pessoas de nome duplo como Marco Aurélio, mas sabia também que era impossível tirar algo de sua cabeça imensa e teimosa, nos últimos tempos adornada com uma barba hemingwayana.
“O homem sábio domina o sexo, e não é dominado por ele”, digo.
“Você precisa parar de ler literatura oriental”, diz Thunder. “Essa história de om, meditação transcendental, ioga. Tudo bobagem. Felicidade é você poder entrar numa mulher bela e infelicidade é não poder. Basicamente isso. O milionário impotente. Quanto ele daria de sua fortuna por uma noite de sexo?”
Ocorreu a Mim que o Henry de Roth daria a vida. Mas me ocorreu também uma dúvida. O típico homem rico. O que ele valoriza mais: o sexo ou o dinheiro. Se ele tivesse que escolher entre um e outro, qual pegaria e qual largaria? Thunder tinha certeza de que ficaria com o sexo, mas eunão estava tão convicto assim.
“Fabio.”
“Hmmm.”
“Viu Fatal?”
Thunder falava de um filme inspirado em outro romance de Roth, O Animal Agonizante.
“Não. Devo?”
“Sim. A crítica foi dura, mas todos sabemos que os críticos de cinema detestam cinema. Um editor de revistas uma vez disse que o melhor emprego do mundo é crítico de cinema. Te pagam para ver filme.”
“Por que devia ver?”
“Porque é Roth na essência”, diz Thunder. “O mundo governado pelo sexo. Um professor apaixonado por uma aluna bem mais jovem que ele, e que deixa de viver a história porque tem medo de que uma hora apareça um cara jovem que vai roubá-la dele. Eu já fui esse cara jovem, o professor diz no filme a um amigo.”
“Thunder.”
“Hmmm.”
“Olha. A melhor coisa que ouvi sobre essa história de homem mais velho e mulher jovem foi do Mantraman. Ele namora uma moça chamada Rebeldia, uns vinte anos mais nova que ele.”
“E …”
“E ele disse que quando perguntam se ele não teme o risco de ser trocado por um cara mais novo responde que também ele poderia trocar a Rebeldia por uma mulher mais nova.”
“Preciso ler mais o Mantraman”, diz Thunder. “Grande frase.”
“Fabio.”
“Hmmm.”
“De tudo que eu disse nessa conversa só queria que você gravasse uma coisa. O dinheiro sem ereção é absolutamente inútil. O mendigo potente é um rei perto do rico impotente.”
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