segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Sanguessugas: 39 acusados por CPI são candidatos

09/2010 - 07h00
Sanguessugas: 39 acusados por CPI são candidatos
Mais da metade dos 72 parlamentares denunciados por comissão que investigou máfia das ambulâncias disputa as eleições deste ano. A maioria quer voltar ao Congresso. Pelo menos 27 deles respondem pelo caso na Justiça
Divulgação
O ex-deputado federal Nilton Capixaba, acusado de receber R$ 631 mil no caso dos sanguessugas, quer voltar à Câmara. Na foto, publicada em seu site, ele aparece em comício em Alvorada do Oeste (RO)
Edson Sardinha e Eduardo Militão

Escândalo que envolveu o maior número de parlamentares em todas as legislaturas, a chamada máfia das ambulâncias resultou na abertura de processos de cassação contra 69 deputados e três senadores em 2006. Ninguém foi cassado. Mas apenas sete se mantêm no Congresso até hoje. Quatro anos depois, 39 dos 72 congressistas denunciados pela CPI dos Sanguessugas correm atrás agora de um novo mandato.

Entre os candidatos, 27 ainda têm contas a acertar com a Justiça Federal de Mato Grosso, onde tramita a maioria dos processos desencadeados pela Operação Sanguessuga, da Polícia Federal e do Ministério Público Federal. É o que revela levantamento feito pelo Congresso em Foco. De olho no voto do eleitor, eles respondem pelos crimes de quadrilha ou bando, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

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Na lista dos processados estão, por exemplo, os ex-deputados Nilton Capixaba (PTB-RO) e Cabo Júlio (PMDB-MG), que deixaram a Câmara com parecer do Conselho de Ética pela cassação de seus mandatos. A falta de prazo após a decisão do Conselho impediu a análise dos pareceres pelo Plenário antes do término da legislatura que acabou em 31 de janeiro de 2007.

Vereador em Belo Horizonte, Cabo Júlio foi o primeiro parlamentar condenado em primeira instância por envolvimento com a máfia das ambulâncias, em agosto do ano passado. O peemedebista – que em abril admitiu responsabilidade no caso – recorre da decisão da 7ª Vara da Justiça Federal em Minas Gerais.

Apontado pela CPI como um dos líderes do “braço político” do esquema de venda de emendas parlamentares e superfaturamento de ambulâncias, Nilton Capixaba foi acusado de receber R$ 631 mil do esquema, o segundo maior montante dentre todos os congressistas. De acordo com pesquisas locais, ele aparece na quarta colocação na disputa por uma vaga de deputado federal por Rondônia.

O Congresso Nacional é o principal objeto de desejo dos candidatos que tiveram o nome, de alguma forma, associado à máfia das ambulâncias: 24 buscam um mandato na Câmara dos Deputados e três, de senador. Outros dois disputam vaga de suplente de senador e dez concorrem a deputado estadual.

Nova chance
O Congresso em Foco procurou os ex-parlamentares denunciados pela CPI dos Sanguessugas que buscam um novo mandato. Entre os que retornaram o contato feito pela reportagem, o sentimento é de que o eleitor está disposto a lhes dar uma nova chance. Acusados de receber propina em troca de emendas para a compra de ambulâncias, todos alegam inocência e se dizem vítimas de denúncias caluniosas dos empresários Luiz Antônio Vedoin, Darci Vedoin e Ronildo Medeiros, sócios da Planam, empresa que encabeçava o esquema. Os empresários também respondem criminalmente à Justiça.

“Lamentavelmente no Brasil, a palavra de um marginal, corrupto ou ladrão vale mais do que a palavra de um representante do povo. Se o marginal acusa, não precisa provar nada. Para a mídia, tudo passa a ser verdade, e o representante do povo então tem que provar que é inocente. Há uma clara inversão do ônus da prova”, reclama a ex-deputada federal Edna Macedo (SP), candidata a deputada estadual pelo PSL.

Edna diz que está provando sua inocência na Justiça e que, em vez de enriquecer, empobreceu durante o mandato na Câmara. “Perante a Justiça estou provando a minha inocência até porque inexiste qualquer prova de meu enriquecimento ilícito. A bem da verdade, durante o meu mandato de deputada federal fiquei mais pobre e os membros da minha família também. Nunca ostentei sinais de riqueza”, afirma.

A candidata acrescenta que não tem motivos para se envergonhar. “Sou serva de Deus e tenho a consciência tranquila de que exerci o meu mandato com dignidade, honestidade e a acima de tudo com lealdade aos meus eleitores e amigos. Ando de cabeça erguida e pedindo voto a cada pessoa que encontro”, declara a ex-deputada, irmã do bispo Edir Macedo, fundador da Igreja Universal do Reino de Deus, e tia do senador Marcelo Crivella (PRB-RJ).

“Denuncismo” e leviandade
De olho em uma nova cadeira na Câmara, Nilton Capixaba classifica como “levianas” as acusações de que teria participado da máfia das ambulâncias. Segundo ele, a confirmação de sua candidatura pelo Tribunal Regional Eleitoral de Rondônia, por unanimidade, reforça sua idoneidade. Em mensagem enviada por sua assessoria, o ex-deputado critica a retomada do assunto pela reportagem.

“O candidato acredita que este episódio de denuncismo pode ter sido encomendado por adversários para tentar desestabilizar sua candidatura que está forte nos quatro cantos de Rondônia. Nilton Capixaba acredita na Justiça e tem certeza de que a população vai saber discernir este momento lamentável da política de Rondônia”.

Presidente do diretório estadual do PTB, Capixaba diz que apenas direcionava as emendas e que não podia, por isso, responder pela execução delas. “Vale ressaltar que o papel do parlamentar é simplesmente direcionar as emendas. Quem realiza a compra e a aquisição do objeto é a prefeitura e quem aprova os projetos para aquisição das ambulâncias é o Ministério da Saúde” destacou Nilton Capixaba.

Candidato a senador pelo PSC de Rondônia, Agnaldo Muniz também se diz vítima de perseguição política. “Provei minha inocência. Foi maracutaia do PMDB. Todas as testemunhas me inocentaram. A Polícia Federal diz que nada foi encontrado a meu respeito. O negócio é direcionado só para prejudicar minha campanha”, protesta o ex-deputado, que ainda responde a processo na Justiça Federal de Mato Grosso pelo caso.

“Precisava me afastar daquele rolo”
Coriolano Sales (BA) aguarda o desfecho do julgamento da Lei da Ficha Limpa para saber se poderá assumir o mandato caso seja eleito em outubro. Ele e Marcelino Fraga (PMDB-ES), hoje candidato a deputado estadual, foram os únicos a renunciar ao mandato às vésperas da abertura do processo de cassação no Conselho de Ética. Por causa disso, a candidatura dos dois está sendo contestada na Justiça eleitoral.

O ex-deputado baiano do PFL, que tenta retornar à Câmara pelo PSDB, diz que jamais teve contato com qualquer integrante da máfia das ambulâncias e que não se arrepende de ter renunciado, mesmo vendo que nenhum de seus colegas acusados foi cassado.

Coriolano afirma que não poderia “adivinhar” que a lei da ficha limpa, sancionada quatro anos depois, pudesse retroagir. Ele diz ter decidido deixar a Câmara à época para tentar assumir um mandato-tampão na prefeitura de Vitória da Conquista (BA). Segundo colocado na disputa municipal de 2004, Coriolano esperava ser convocado para substituir o então prefeito, cassado pela Justiça eleitoral. “Precisava me afastar daquele rolo”, lembra, em referência à máfia dos sanguessugas.

O candidato diz ter sofrido sérios prejuízos políticos com a denúncia, segundo ele, jamais provada. “Pago essa conta até hoje”, declarou Coriolano. O Congresso em Foco deixou recados no celular de Marcelino Fraga, mas não teve retorno.

Hora da colheita
De olho numa nova vaga na Câmara, Fernando Gonçalves (PTB-RJ) demonstra otimismo. “Quem planta o bem colhe o bem”, afirma o petebista, por meio de sua assessoria. Os auxiliares do candidato se dizem confiantes na eleição e na comprovação da inocência do chefe. “Ele não tem nada a ver com isso. O nome dele apareceu porque teve emenda. Mas quem faz licitação é a prefeitura. Quem manda pagar é o Ministério da Saúde”, acrescenta a assessoria de Gonçalves.

Candidato a deputado estadual pelo PRB, o atual vereador do Rio João Mendes de Jesus nega não só o envolvimento com a máfia das ambulâncias como também que disputa uma cadeira na Assembleia Legislativa. “Ele nem aparece no horário eleitoral, não faz campanha. Candidatou-se por pressão do partido. Ele é candidato, sim, à reeleição de vereador em 2012”, informa a assessoria do ex-deputado.

O paraibano Carlos Dunga diz não se incomodar com as denúncias feitas pela CPI. “Estou tranquilo e pronto para responder o que for. Não tenho dúvida de que não tenho participação no fato. Essa demora no julgamento não me angustia”, afirma o ex-deputado, que é suplente do senador Cícero Lucena (PSDB-PB).

Julgamento das urnas

O ex-deputado Heleno Silva preferiu não se candidatar em 2006. Mas agora diz esperar que o povo de Sergipe lhe dê nova oportunidade de representá-lo na Câmara, porque acredita que não existe nada contra ele, apesar de o processo judicial ainda não ter acabado. “Eu acho que eu me devo uma nova chance”, diz Heleno, candidato a deputado federal pelo PRB. “Abri mão de concorrer ao mandato passado. Vou ter o julgamento das urnas, que é o mais importante que existe”.

Josué Bengtson, ex-deputado pelo Pará, destaca que sua candidatura foi registrada sem problemas pela Justiça Eleitoral. Ele afirma que preferiu não disputar nada há quatro anos, quando o episódio da CPI dos Sanguessugas estava em todos os noticiários. “Tomei a decisão naquela época porque “É uma coisa muito ruim você ter que fazer uma campanha explicando”, disse ele, de volta ao cenário político.

Agora, diz Bengtson, a disputa está bem mais difícil. Se antes o PTB precisava de 30 mil votos para eleger um deputado, cada um deve buscar ao menos 100 mil, nas contas do candidato. Tudo por causa da coligação com um número maior de partidos.

Bengtson e Heleno Silva não foram os únicos a não tentarem um novo mandato no calor das denúncias de 2006. Outros 22 denunciados pela CPI dos Sanguessugas não disputaram a eleição. Dos 50 que se arriscaram ir às urnas, apenas cinco se reelegeram: Wellington Roberto (PR-PB), Marcondes Gadelha (PSB-PB), Pedro Henry (PP-MT), Wellington Fagundes (PR-MT) e João Magalhães (PMDB-MG).

Entenda o caso: o que foi a Operação Sanguessuga 

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