quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Sob suspeita, seguro-desemprego ao pescador chegará a R$ 1,3 bi em 2011
Amanda Costa
Do Contas Abertas
Mais de R$ 3,7 bilhões. Esta é a conta paga pelo governo federal a pescadores, desde 2003, para garantir a reprodução de diversas espécies de peixes, durante o período de defeso, onde ocorre a reprodução e os pescadores ficam impedidos de exercer a profissão. O valor do benefício para o próximo ano está estimado em R$ 1,3 bilhão, portanto, 14 vezes maior que os R$ 81,5 milhões pagos no primeiro ano do mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na moeda da época (veja gráficos com a quantidade e o valor).
O auxílio ao pescador é uma assistência financeira temporária de um salário mínimo, concedida apenas ao profissional que exerça, comprovadamente, sua atividade de forma artesanal, individual ou em regime de economia familiar, e que teve as atividades interrompidas por conta do defeso. Essa é a teoria, na prática, investigações do Ministério Público Federal indicam que pelo menos R$ 500 milhões sejam repassados anualmente para as contas de quem nunca pescou na vida.
O procurador da República em Tubarão, Santa Catarina, Celso Antonio Tres, afirma que processou mais de 300 pessoas por fraude no benefício apenas em sua região. “Vimos situações bizarras, já que o único controle para pagar o seguro-desemprego era verificar se a pessoa não tem registro como empregado regular. Então, mesmo que nem soubesse como se pega um peixe, se é pelo rabo ou pela boca, ele conseguia o benefício”, conta.
O procurador critica o Ministério do Trabalho, que deveria fiscalizar com mais rigor a concessão do seguro-desemprego. “Pessoas que atuam em outras atividades, que nunca viram um peixe na vida, se inscrevem na colônia e pagam anuidade. Isso conta como tempo de serviço e eles se aposentam. O sindicato e a colônia disputam para ver quem dá mais atestado. Isso é um caos. A responsabilidade maior é do governo, que precisa de uma medida nacional, já que a lei previa que o Ministério do Trabalho verificaria os requisitos, o que não acontece da forma devida”, afirma.
O ministro do Trabalho, Carlos Luppi, em entrevista ao programa Fantástico exibido no último domingo, disse que nos últimos oito anos, no máximo 15 mil denúncias de irregularidades chegaram ao governo, o que representa menos de 1% dos benefícios pagos. “A maioria são trabalhadores honestos e sérios. A exceção tem que ser punida com rigor. E onde constatamos isso, nós punimos, cancelamos e processamos”, alega. Os recursos pagos saem do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), gerido pelo Ministério do Trabalho.
A lista com os nomes dos beneficiários é sigilosa, não há publicidade alguma, ao contrário do que ocorre no programa Bolsa Família, onde a relação das 12,7 milhões de famílias que recebem o benefício é pública. O ministro Carlos Lupi justifica a não divulgação em nome da segurança. “Um grupo que não tenha aquele padrão da normalidade, que queira prejudicar sabendo quem vai receber, pode organizar assaltos, pode desviar aquele recurso”, diz.
A meta do governo para este ano é beneficiar pelo menos 352,1 mil pescadores com o pagamento do seguro-desemprego. Para o próximo ano, a proposta de orçamento do governo federal, em tramitação no Congresso Nacional, prevê que 553,2 mil pescadores sejam contemplados com o benefício. Mas, para o procurador Celso Tres, caso não haja controle sobre os beneficiários, o seguro-desemprego pode estar com os dias contados. “É um benefício importante do ponto de vista social e ambiental, mas infelizmente é fraudado ao extremo. Por isso que a conta assistencial brasileira é gigantesca. O pescador que é correto fica extremamente prejudicado porque devem acabar com esse benefício daqui a pouco por causa dessas fraudes”, prevê.
Conta bilionária
No ano passado, R$ 934,2 milhões foram pagos a 437,4 mil pescadores. A cifra é mais de quatro vezes o orçamento do Ministério da Aquicultura e Pesca efetivamente executado, que foi de R$ 212,7 milhões em 2009. O valor do seguro-defeso também é três vezes o valor recebido com a exportação de pescados e crustáceos, cerca de R$ 283,1 milhões.
O número de beneficiários com o seguro-defeso, bem como a conta dispensada anualmente, podem ser ampliados. Isso porque tramita na Câmara dos Deputados dois projetos que preveem aumento na quantidade de pessoas atendidas. O PL 6884/10, do deputado Fernando Marroni (PT-RS), determina o pagamento do seguro-desemprego, no valor de um salário mínimo, ao pescador artesanal impedido de exercer a atividade por conta de condições climáticas ou meteorológicas desfavoráveis.
O PL 7139/10, do deputado José Airton Cirilo (PT-CE), estende a todos os trabalhadores envolvidos na cadeia de produção pesqueira o direito ao seguro-desemprego na época do defeso. Pelo texto, passam a ser segurados especiais os trabalhadores artesanais que vivam da seguintes atividades: pesca; explotação e exploração; cultivo, conservação; processamento; transporte; comercialização; pesquisa dos recursos pesqueiros; reparo das redes e das embarcações; e captura ou coleta de caranguejos e de mariscos.

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